(RE)Acreditando no Natal
"É véspera de Natal. Ótimo. Mais
um ano onde todos comemoram e eu fico chorando lembrando do meu pai. Sim, ele
morreu no Natal. Tem coisa mais triste que isso? Deve ter, mas não para mim.
Não para minha família, que todo ano comemorava o Natal juntos, felizes e
agora... Agora ainda nos reunimos, mas não é a mesma coisa sem meu pai e nunca
será. Nunca mais eu e meus irmãos iremos fingir que estamos dormindo e esperar
o "papai Noel" aparecer, nunca mais vamos fazer biscoitos para ele,
nunca mais vamos enfeitar a árvore com a mesma euforia que anos antes. Porque
para nós não temos mais um papai Noel."
Foi com esse pensamento que acordei
de manhã, mais um ano se passava sem a presença do meu querido pai.
- Luana! Acorda menina! Já está tarde
e você tem que sair para comprar as coisas que faltam. - gritou a minha mãe.
- Já vou! - me levanto e olho para a
janela, não tem neve. Ótimo. Alguém bate na porta. - Mãe, eu já tô indo!
- Não é a mãe, Lu, sou eu. - e minha
irmã caçula aparece ainda de pijama e coçando o olho. - Pedro tá perguntando se
você vai querer ajudar a arrumar o resto que falta da casa com a gente.
- Vamos arrumar a casa, para o
Natal?! - minha mãe só podia ter enlouquecido.
- Mamãe falou que já tava na hora de
comemorarmos como antes, mesmo eu não lembrando muito bem como era, ela disse
algo como "seu pai ficaria muito triste se deixássemos isso se prolongar
por mais tempo". Então eu e o Pe estamos arrumando a casa e está sendo tão
divertido Lu, você vem né? - disse ela gesticulando as aspas e depois me
olhando com a cara mais fofa do mundo. É claro que ela não lembrava como era,
ela só tinha 1 ano quando papai morreu.
- Eu preciso fazer a feira, depois a
gente vê isso, pode ser? - eu disse já me arrumando para sair, não aguentaria
ficar naquela casa sabendo que ela estava sendo arrumada para o natal nem mais
um minuto. Por que minha mãe fez isso? Ela só poderia está brincando. Uma
vontade de chorar me surgiu, mas segurei e engoli o choro. Peguei meu celular,
a carteira e a lista de coisas para comprar e saí em disparada para o
supermercado.
Quando cheguei no supermercado
começou a esfriar, sinal de neve. As crianças a minha volta estavam animadas
com a possibilidade e ficavam o tempo todo puxando suas mães para fora. Eu
fiquei parada durante um tempo, observando essas crianças felizes, olhando para
o céu, esperando a tão sonhada neve de natal cair.
Entrei para comprar logo as coisas
antes que ficasse mais difícil para voltar caminhando para casa com todas as
sacolas que eu teria que levar. Fui olhando a lista e percebendo que minha mãe
estava, realmente, disposta a fazer uma bela ceia de Natal para nós esse ano.
Porque ela não me avisou desse seu plano? Provavelmente, porque sabia que eu
seria contra. Paguei as compras e me preparei para ir embora, mas percebi que
não teria como eu levar tudo sozinha. Ótimo, o dinheiro não dava para eu ir de
táxi, teria que ligar para minha mãe. Chamou e deu na caixa postal. Obrigada
mãe. Peguei as sacolas em duas levas e me sentei num banco do supermercado. Já
estava ficando tarde e a neve estava aumentando.
- Dia difícil? - virei e olhei para
cima, um cara, por volta dos 40 anos, com uma barba grande de mentirinha branca
estava parado ao meu lado. Só faltava essa.
- Não é da sua conta. - respondi
grosseiramente.
- Posso sentar ao seu lado? - Virei a
cara. E ele entendeu como um sim. Ótimo.
- Hoje foi o dia que eu mais
trabalhei. - eu olhei de soslaio,ele continuou - Você sabe, trabalhar como
papai Noel no supermercado. As crianças hoje se multiplicam para tirar fotos, pedir
seus desejos e tudo mais.
- Não sabia que tinha isso por aqui.
- É, decidiram fazer esse ano e eu
fui o contratado para esse papel. Você gosta do Natal? - vendo que eu não iria
responder, continuou - Eu, gosto me lembra dos bons momentos que eu tive. Gosto
de todo o significado. Sabe qual é o significado do Natal pra mim? É uma forma
de estar mais perto de quem se gosta. Você pode passar o ano inteiro sem falar
com a pessoa, mas no Natal todo mundo se reúne para desejar coisas boas uns aos
outros, é claro que quando é família sempre tem uma briga ou outra, mas gosto
disso torna tudo mais real e íntimo. Você quer ajuda?
- O quê? - perguntei assustada.
- Ajuda, para levar as coisas, já
estamos aqui a alguns minutos e ninguém veio para te buscar, pensei que estava precisando
de ajuda e vim aqui.
Olhei para ele pela primeira vez. Ele
parecia que não estava mentindo. Algo em seus olhos me fez acreditar que
realmente estava disposto a ajudar. Eu ponderei durante alguns minutos, vi no
celular que estava ficando tarde e minha mãe deveria realmente está ocupada por
não ter retornado as minhas ligações.
- Não vamos de carro. Eu moro perto
daqui, você pode me ajudar a levar as coisas andando? - respondi erguendo uma
sobrancelha, porque é claro que eu não aceitaria entrar num carro com um
desconhecido.
- Certo, não tenho carro mesmo. - me
surpreendi, mas muitas pessoas aqui não têm carro mesmo. Me levantei carregando
algumas sacolas, ele pegou as outras.
Saímos do supermercado e estava
vetando muito e a neve não ajudava muito a enxergar o que estava a frente, mas
como o caminho era conhecido não fiquei com medo. O estranho começou a puxar
assunto, perguntando o meu nome e coisas banais, contei a ele dos meus irmãos
mais novos (a quem ele se interessou bastante) e sobre a minha mãe. Depois ele
perguntou o porquê de eu não gostar do Natal.
- Meu pai morreu. Há 5 anos, no
natal, acidente de carro... Foi isso. - disse com a voz embriagada pelas
lágrimas que se forçavam a sair e eu não deixava.
- Me desculpe, por me intrometer
tanto... Ele gostava de comemorar?
- Não se preocupe, ele amava o Natal,
todos nós lá em casa amávamos.
- E agora vocês não comemoram mais...
- Não comemorávamos até hoje. Não sei
por que, mas minha mãe decidiu comemorar, hoje de tarde eles estavam arrumando
a casa e foi quando eu sai para fazer as compras, não iria aguentar ficar lá,
sabendo que meu pai não iria aparecer.
- Deve ser complicado, mas não acho
que seu pai gostaria que vocês não comemorassem mais o Natal, você mesma disse
que ele gostava muito, talvez seja um modo de ficar mais perto dele,
comemorando algo que ele gosta. Sei que pode ser difícil para você, mas aposto
que seu pai ficaria feliz se todos vocês estivessem feliz. Esses anos que se
passaram, tenho certeza que foi triste para você, por não ter seu pai, para sua
mãe por não ter seu marido, sua companhia diária, seu melhor amigo e seus irmão
por não poderem comemorar uma festa tão especial e mágica quanto o Natal é para
as crianças, visto que eles eram muito jovens para lembrar do ocorrido. Sei que
seu pai gostaria de ver vocês felizes mais que tudo nesse mundo, que ele os
amavam. E se comemorar o Natal ajudaria a manter vocês mais próximo dele, por
que não?
Eu parei e olhei para ele. Eu nunca
havia pensado dessa forma. Será mesmo que meu pai ficaria feliz que comemorássemos
o Natal sem ele?
- Pronto chegamos. - ele disse. Me
assustei não havia percebido que estávamos tão perto de casa assim.
- Obrigada, por me ajudar...
- Tenha um feliz Natal Lulu, você e
toda a sua família. - ele me deu um abraço e sorriu para mim. E com isso foi
embora.
- Ei! Mas você não me disse o seu
nome! - gritei, mas ele não me escutou já havia virado a esquina.
Quando abri a porta de casa dei de
cara com meus irmão mais novos todos animados com os presentes, ainda intactos,
em baixo da árvore de Natal na sala.
- Olá! Agora me ajudem aqui, a levar
essas coisas para a cozinha.
Assim fomos os três em direção à
cozinha, onde minha mãe estava.
- Filha! - disse ela me abraçando -
Desculpa não ter te atendido, tive que ir na loja de brinquedos comprar os
presentes dos seus irmãos, deixei eles com a vizinha, mas você sabe como eu
fico com isso né? Então meu celular descarregou e só cheguei quase agora.
Agora, quanta sacola você trouxe. Você veio sozinha nessa neve?!
- Não se preocupe mãe. Não, eu tive
ajuda de um homem lá do supermercado. Ele veio até aqui... - então me dei conta
que em nenhum momento disse onde morava e ele sabia exatamente onde era, pelo
modo que me avisou quando chegamos, mas como isso? Percebi que minha mãe me
observava e continuei - Ele veio até aqui e me ajudou com as compras.
- Você sabe o que eu penso sobre isso
né? Não deveria sair por ai aceitando ajuda de estranhos, Luana! Sorte sua que
ele era um bom moço.
- Era sim mãe. Agora me diz, por que
a senhora decidiu isso logo agora?
Ela ficou vermelha.
- É, eu sei que vai parecer estranho,
mas eu sonhei com seu pai, sonhei que ele dizia que comemorar o Natal nos faria
bem e que era um modo de ficarmos próximos dele e também nos aproximarmos mais.
Besta né? Eu sei que se você soubesse mais cedo não aceitaria e por isso... -
disse ela com a voz falhando - Eu sinto tanta a falta dele, achei que este ano
nós poderíamos... Ao menos uma vez, prometo que ano que vem não faremos nada.
Eu só achei que seria uma boa ideia, vendo o sorriso dos seus irmãos ao
enfeitarem a árvore. Foi tão bom, minha filha. Você consegue me entender.
Meu pai... Ela deve ter percebido minha cara de assustada, mas não liguei. Será que era possível? Olhei para ela e sorri.
- Sim mãe, eu entendo e não vejo mais motivos
para não comemorarmos o Natal, você está certa, ele iria gostar, tenho certeza.
- e assim abraço ela, nesse momento olhei para janela da cozinha e vi uma
estrela cadente passando, fechei os olhos e disse baixinho: te amo pai, estava
com saudades.
Meu pai... Ela deve ter percebido minha cara de assustada, mas não liguei. Será que era possível? Olhei para ela e sorri.
Muito lindo mesmo.
ResponderExcluirNossa *.* Eu Amei.. :)
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